a tradição em renovação

vaguear pelas pulsações das notas

partilhar o hábito

o espaço contém o improvável das coisas

o ar carregado com o peso da terra

o céu a cair em mim

a luz que atravessa o corpo dum lado ao outro

ideias proibidas a sair pelos poros da chuva misturadas com o cheiro da cidade

o simples toque frio teleporta-nos para dentro

começou uma nova história

não sei o que ainda existe dentro de mim só sei que é teu

mesmo que o sangue seja diferente, existe química
não há nada mais valioso que o amor canino

a temperatura a bater na pele abafa o tédio

no cimo da terra quase a tocar o vapor da àgua

a ver passar a sombra da memória

à espera do tempo

o tempo flutua pelas ondas de ar

a harmonia a vibrar pelas paredes

planos para o infinito

quando tudo mudou e a vida foi forçada a fazer uma pausa

quero ir para o mundo

auto retrato do vazio

bocados de memórias de alguém

a outra dimensão da cidade

já não chega sonhar

sentir de perto o toque das estrelas

aprendi a mentir a mim própria

mentalmente exausta das esperanças que não tenho

a viver uma realidade estranha aos sentidos

"Não lhe ocorreu pensar no que eu podia fazer enquanto bebesse whisky. Um espectáculo de fogo-de-artifício, por exemplo. Irreprimível. Lindo. Só visto. Só eu é que vi. Não estava lá mais ninguém dentro de mim."

fotossíntese para esquecer o regresso

na calçada ficaram as pedras do meu coração

onde descansam os males da alma

momentos que me fazem esquecer a inevitabilidade

a tinta crua transforma-se em asas

o início das coisas

incompleta

quero voltar a respirar, sinto que estou pronta

quero livrar-me de ti

"Tenho a casa desarrumada de mim. Não pertenço aqui. Se entrarem, tenham ao menos a galhardia de me deixar sair primeiro."

o ano dos desejos

"O peito pôs-se-lhe logo a arquejar aceleradamente. A língua saiu-lhe toda da boca; os olhos, revirando-se, desmaiaram como dois globos de lâmpadas que se extinguissem, fazendo crer que já estava morta, se não fosse o pavoroso ritmo das costelas, sacudidas por uma respiração furiosa, como se a alma estivesse dando pulos para se libertar."

o tudo e o nada ao mesmo tempo

dá-me a tua melhor faca para cortarmos isto em dois e amanhã esquecer

parte de mim

já não dá para regressar ao que fomos

paralelos em câmara lenta

realidades que ficaram num tempo em suspensão

"-Bem sei - objectou o padre - que existem boas obras, de bons autores; no entanto, basta estarem reunidas pessoas de sexo diferente num salão encantador, ornado de pompas mundandas, ainda com os disfarces pagãos, as pinturas do rosto, as luzes, as vozes efeminadas, para que tudo acabe por engendrar uma certa libertinagem de espírito e sugira pensamentos desonestos, tentações impuras."